Informativos do STJ

STJ, CC 178.697. Estelionato. Uso de imagens de documentos federais para induzir a vítima em erro. Inexistência de prejuízo a interesses, serviços ou bens da União. Conflito conhecido para declarar a competência da Justiça Estadual.

Situação Fática: Mário Malandro cometeu o crime de estelionato contra certa empresa sediada na China e que tem sucursal em Recife/PE.

Para tanto, utilizou-se de imagens de um passaporte verdadeiro, alterando, contudo, o nome do seu titular nas imagens, para que passasse a constar como se fosse seu.

Além disso, apresentou documentação com selo falso que seria do Ministério da Agricultura.

A vantagem indevida, por sua vez, foi transferida pela vítima para uma conta bancária situada nos Estados Unidos.

Controvérsia: Nesse caso, qual juízo será o competente para processar e julgar o crime de estelionato? Da Justiça Federal ou da Justiça Estadual? De qual Subseção Judiciária ou Comarca?

Decisão: Para o STJ, a competência para o julgamento do crime de estelionato, ainda que se tenha utilizado de imagens digitais adulteradas de passaporte válido de terceiro e documentos emitidos por órgão públicos federais, quando inexistente evidência de prejuízo a interesses, bens ou serviços da União, é da Justiça Estadual, devendo ser respeitada a regra de foro do domicílio da vítima no caso de o crime ser praticado mediante depósito, transferência de valores ou cheque sem provisão de fundos em poder do sacado ou com o pagamento frustrado.

Fundamentos: No caso apresentado, conquanto o estelionatário tenha se utilizado de imagens digitais adulteradas de passaporte válido de terceiro e documentos emitidos por órgão públicos federais para, induzindo a vítima em erro, receber depósito de valores em conta corrente no exterior, não havia qualquer evidência de prejuízo a interesses, bens ou serviços da União (CF, art. 109, IV), pois não houve falsificação de passaporte, mas, sim, a apresentação, por meio virtual, de uma imagem adulterada de documento válido, com a finalidade de enganar o destinatário.

Igualmente, a falsificação do selo imputado ao Ministério da Agricultura ocorreu para dar falsa aparência de credibilidade ao negócio, em prejuízo da vítima, o que não implica lesão aos interesses desse órgão federal.

De outro giro, não se vislumbra crime previsto em tratado ou convenção internacional, de sorte que não se pode cogitar da incidência do inciso V do art. 109 da CF. Logo, inexiste competência da Justiça Federal para processar e julgar o feito, razão pela qual, não havendo nenhum laivo de competência de Justiça especializada (Militar ou Eleitoral), a competência será da Justiça Estadual.

Firmada a competência da Justiça Estadual, deve-se ter presente a nova regra de competência territorial prevista no § 4º do art. 70 do CPP, introduzida pela Lei 14.155/21.

Recorde-se o seu teor: (...)
“Art. 70.  A competência será, de regra, determinada pelo lugar em que se consumar a infração, ou, no caso de tentativa, pelo lugar em que for praticado o último ato de execução. (...) § 4º Nos crimes previstos no art. 171 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), quando praticados mediante depósito, mediante emissão de cheques sem suficiente provisão de fundos em poder do sacado ou com o pagamento frustrado ou mediante transferência de valores, a competência será definida pelo local do domicílio da vítima, e, em caso de pluralidade de vítimas, a competência firmar-se-á pela prevenção.”
Praticado o delito de estelionato mediante transferência de valores - a atrair a incidência do art. 70, § 4º, do CPP -, a competência será do juízo do local do domicílio da vítima.

Cuidando-se de pessoa jurídica, o art. 75, § 2º, do Código Civil estatui que, “Se a administração, ou diretoria, tiver a sede no estrangeiro, haver-se-á por domicílio da pessoa jurídica, no tocante às obrigações contraídas por cada uma das suas agências, o lugar do estabelecimento, sito no Brasil, a que ela corresponder.”.

Desse modo, ainda que a sede da empresa vítima se encontre na China, sua representação, no Brasil, situa-se em Recife/PE, pelo que a competência para processar e julgar o caso será da Justiça Estadual da Comarca de Recife/PE.

Abaixo, você pode conferir a explicação desse julgado em vídeo:






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